Sobre viver na era da pandemia
Yanyun Chen, Wind
charcoal on paper
2016
Giorgio Agamben tenta nunca nos deixar esquecer que manter-se vivo não é exatamente a mesma coisa do que viver. E mesmo tendo sido repudiado por equivaler o novo coronavirus com uma gripe comum, o seu ponto, de que há uma diferença entre viver e meramente se manter vivo, não deve ser deixado de lado. Pois, mesmo que as características to coronavirus significam que nossas vidas tiveram que mudar radicalmente para que potencialmente sobrevivessemos, o fato de que o distanciamento social virou a ordem do dia e de que tivemos que desistir de muitos dos nosso rituais sociais sugere que – já que nosso habitus é formado por nossos hábitos – estamos de fato mudando, re-formando, o que significa ser humano.
Nesse sentido, mesmo enquanto Slavoj Žižek parece criticar Agamben — “não apertar mãos e se isolar quando necessário É a forma presente de solidariedade” — seria um erro ler essas duas afirmações como antonímicas.
Pois, não deveríamos esquecer do belo lembrete de Jean-Luc Nancy de que é o espaço que é necessário em primeiro lugar, para o toque.
Não tão longe, mas também não perto demais:
e onde talvez o que seja necessário seja que nós criassemos uma distância devida entre nós mesmos.
Pois, como a grande, falecida Anne Dufourmantelle continua a nos ensinar: “estar completamente vivo é uma tarefa, e de forma nenhuma algo dado. Não é simplesmente estar presente para o mundo, mas estar presente pra si mesmo, alcançando uma intensidade que é, em si própria, uma forma de renascer”.
E onde, talvez, a própria tarefa perante nós seja descobrir como manter o social — trazer à tona o “nós” — enquanto se mantendo fisicamente distante.
Notas:
[1] https://ilmanifesto.it/lo-stato-deccezione-provocato-da-unemergenza-immotivata/
[2] http://thephilosophicalsalon.com/monitor-and-punish-yes-please/
[3] Anne Dufourmantelle, ‘The Ideology of Security’, public lecture at The European Graduate School, (August 2011): https://www.youtube.com/watch?v=8SMwkpRWZ0Y&feature=emb_title
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Uma versão anterior desse ensaio foi publicada em Positions, e pode ser encontrada aqui: http://positionswebsite.org/jeremy-fernando-on-living-in-the-age-of-pandemic/
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Jeremy Fernando lê, e escreve; e é o Jean Baudrillard Fellow na The European Graduate School. Ele trabalha na intersecção entre a literatura, a filosfia, e as medias; e seus mais de 20 livros incluem Reading Blindly, Living with Art, Writing Death, in fidelity, and resisting art. Seus escritos também aparecem em revistas como Arte al Límite, Berfrois, CTheory, Cenobio, Full Bleed, positions, Qui Parle, TimeOut, VICE, and Voice & Verse Poetry Magazine, entre outras; e têm sido traduzidas para o Francês, o Alemão, o Italiano, o Japonês, o Espanhol, o Sérbio e o Português. Explorar outras medias o levou à filmes, música, e às artes visuais; E seu trabalho foi exibido em Seoul, Vienna, Hong Kong, e Singapore. Foi convidado a fazer leituras em Akademie der Künste em Berlin em September 2016; e em November 2018, uma série de falas performativas na 4ª edição da Bienal de la Imagen en Movimiento em Buenos Aires. Ele é o editor geral de ambas Delere Press e a revista temática One Imperative; e é professor da Tembusu College na The National University of Singapore. Vitor Pequeno é escritor, poeta e tradutor, que mora em São Paulo. Yanyun Chen é um artista e professor de Singapura.